quarta-feira, 5 de outubro de 2011

OK Computer


(1997) Radiohead – OK Computer
Track list:
1. “Airbag” – 4:44
2. “Paranoid Android” – 6:23
3. “Subterranean Homesick Alien” – 4:27
4. “Exit Music (For a Film)” – 4:24
5. “Let Down” – 4:59
6. “Karma Police” – 4:21
7. “Fitter Happier” – 1:57
8. “Electioneering” – 3:50
9. “Climbing Up the Walls” – 4:45
10. “No Surprises” – 3:48
11. “Lucky” – 4:19
12. “The Tourist” – 5:24

RADIOHEAD
"OK Computer"
veredicto:
| 0.0 | 1.0 | 2.0 | 3.0 | 4.0 | 5.0 | obra-prima/álbum de culto
Se tivermos de escolher apenas um álbum dos anos 90, a decisão será sempre controversa e nunca consensual. Mas se nos for permitido segurar um álbum em cada mão as dúvidas dissipam-se e termina o rol de discussões. “Nevermind” dos Nirvana marcou o último grande “hype”; “OK Computer” fez as pazes entre o rock e a electrónica; o mundo da música serenou quezílias e principiou uma nova fase; por todo o lado quem tinha perdido a fé, deambulava perdidamente ou suspirava de desconsolo pôde finalmente deitar-se, dormir e sentir-se levitar. Primeiro expiaram-se as raivas. Chegou a altura de assumirmos que o futuro está sempre a chegar e não vai parar por nossa causa. Pode ser difícil. Mas agora pelo menos temos banda-sonora para ajudar. Obrigado, Radiohead.

São 12 músicas. 53 minutos e 49 segundos. Zeros e uns queimados ou estampados na película dos CD’s. Impulsos eléctricos gravados nas fitas de crómio e ferro. Uns quantos a escutarem os arranhos da agulha no vinil. E no fundo é tudo apenas música. No fundo apenas umas quantas letras com melodia. No fundo nada. No fundo o passado não existe sem memória. No fundo o presente é apenas o futuro a acontecer permanentemente. No fundo nada disto interessa. Nada disto interessa se estivermos sós, como se ouve na voz trémula e sofrida de Yorke em “Exit Music (for a film)”: “Breathe... keep breathing / I can’t do this alone.”
E desde a Oxford de 1989 até aos nossos dias que estas “cabeça de rádio” não têm estado sozinhas. Abalando a frustração e angústia de todos os teenagers e não teenagers com o sucesso mundial que foi “Creep”, seguiu-se um álbum puramente rock; melódico, crú, suave, melífluo, áspero, seco, doce... “The Bends” estourou com várias cordas de guitarra e tops de vendas. Na TV os videoclips lá iam chamando a atenção, mas estes tipos nunca disseram que estavam satisfeitos com o que quer que fosse.
Sai o CD-single alargado “My Iron Lung” e percebe-se que há qualquer coisa mais. A banda pára. Escuta o que há à sua volta. Ouve as próprias guitarras e sente-se cansada delas. Olha uns quantos anos-luz à frente. Deixa os dias acabarem e assim que a noite se aproxima aproveita o lusco-fusco para escrever o que vai na alma; faz passar as reverberações e os arranjos por uns quantos Pentium e sintetizadores e eis que a fénix renasce novamente. “OK Computer” sai com “Paranoid Android” como single de estreia e os 6 minutos e meio transformam-se imediatamente na sinfonia para o final de milénio.
Nos dias de hoje é difícil fazer perceber a estranheza e completo espanto avassalador depois de ouvir “OK Computer” em 1997. Mais estranho só mesmo a primeira vez que “Smells Like Teen Spirit” passou na rádio no início da década. Mas os Radiohead não pretendem subverter o sistema nem tão pouco destruí-lo. Sabem que ele possui tanto de bom como de mau. Antes reflectem a angústia da solidão e o pânico da rapidez de mudanças.
Aliás, o próprio alinhamento do álbum é reflexo dessa transformação, tanto da década como na banda. Se em “Airbag” arrancamos com “In the next world war / in a jackknifed juggernaut, I am born again”, pela última faixa, “The Tourist”, já Thom Yorke implora “They ask me where the hell I'm going / At a 1000 feet per second, / Hey man, slow down, slow down”. Está tudo a mudar rapidamente demais. As linhas de metro aceleram e expandem-se. Há mais canais de TV. O MacDonald’s alargou os menús. Os desodorizantes e os telemóveis estão mais pequenos e concentrados. E não há meio de parar.
Para quem pretende encontrar o seu lugar no mundo isto é dramático. Não admira, portanto, que por entre as cartas de fãs as frases “your record changed my life” ou “...helped me” se repitam ‘over and over again’.
Fitter Happier”, faixa inteiramente lida por uma personagem informática abstracta e sem ênfase, é o documento mais emblemático do álbum, embora não o pareça. Não é completamente original, mas sumaria exemplarmente e, quase apetece dizer, ‘Orwellicamente’, o que se passa. Um tratado de bons princípios e desejos sãos, alinhamento de uma realidade idealizável e ideal. Tudo parece realmente perfeito. Parece... Não fosse a escolha da voz e a quase inaudível mensagem de fundo a passar ciclicamente: “This is the Panic Office, section nine-seventeen may have been hit. Activate the following procedure.”
Nem por acaso segue-se “Electioneering”. O álbum atinge o pico da raiva e da ironia. As palhetas gastam-se nas cordas das guitarras e percebe-se que até no mais puro rock a banda mexeu nalguma coisa. A sonoridade é apenas um dos pontos chave, mas a já referida e anterior “Paranoid Android” revela que a estrutura rompeu-se; o corpo-refrão-corpo-refrão-solo-refrão-fim ficou de fora; abriram-se as portas à completa liberdade. Para quê estar a voltar atrás sucessivamente?
Apesar da sonoridade dolorosa e das guitarras ainda prevalecerem, é inquestionável que “OK Computer” está voltado para o futuro. Cada música fala de um dilema e até de um pesadelo, de pânico e de receio, de amor e de solidão, de Yorke, dos Radiohead e de todos os felizes cidadãos a acordar de manhã e a ir para as suas aulas e locais de trabalho.
É assim que, aparentemente reconciliadora, “No Surprises” nos embala pela melodia, nos assusta com os primeiros versos mas termina com a mesma impressão geral que nos deixa ficar o álbum: de que tudo vai acontecer à mesma, só podemos mudar como e onde vamos estar a ver tudo acontecer: “You look so tired-unhappy, / bring down the government, / they don't, they don't speak for us. / I'll take a quiet life, / a handshake of carbon monoxide, / with no alarms and no surprises, / ... / Silent silence”.
Eu vou estar à varanda. Lá fora nas ruas o habitual chinfrim e zumzum de carros e gente em rodopio. Do ar uma nave extra-terrestre vai pousar por entre os aviões. O mundo vai explodir mas na certa sai no dia seguinte a notícia de que os políticos assinaram um novo tratado de cooperação. Por agora, na aparelhagem da sala o CD vai tocando. Eu digo apenas “Ok” a tudo.
Com um álbum assim até dá para aceitar o mundo e nem ficar chateado.
R.J.T.

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