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quarta-feira, 5 de outubro de 2011

The King Of Limbs


(2011) Radiohead – The King Of Limbs
Track list:
1. “Bloom” – 5:15
2. “Morning Mr Magpie” – 4:41
3. “Little by Little” – 4:27
4. “Feral” – 3:13
5. “Lotus Flower” – 5:01
6. “Codex” – 4:47
7. “Give Up the Ghost” – 4:50
8. “Separator” – 5:20

Para muitos a arte nos dias de hoje não passa de um cadáver agonizando em meio ao caos da vida contemporânea. A banalização da vida, a violência, a degradação do meio ambiente, os jogos da propaganda consumista, a falta de uma certa espiritualidade, reúne elementos que tornam o ato de viver difícil, tenso, a não ser que você tenha em mente o desprezo pelo ser humano, pela natureza e abrace uma vida distante das questões que afligem nosso tempo.
Nesse sentido, poucos artistas, ainda comovem e causam algum tipo de estrondo e alvoroço nos tempos onde o consumo (de musica por exemplo) é imediato e descartável.
Quando surgiram em 1993 com seu debut (Pablo Honey) os Radiohead eram vistos como mais um grupo de grunge influenciados por nirvana, dois anos depois, fizeram um dos grande discos do rock inglês dos anos 90, o The Bends e se consagraria como o grupo a ser seguido no fundamental Ok Computer (1997).
Mas, a partir daí, O Radiohead reescreveu sua história e seguiu passos que dividiram muitos fãs, para não dizer que alguns se sentiram órfãos.
a verdade é que a banda dos amigos Thom Yorke, Ed, Phil e os irmãos Greenwood sempre foi inquieta e sempre dialogou com seu tempo.
Ok Computer captava um momento importante de avanço tecnológico, futurismo, o homem moderno de finais de século, sua condição como ser e em sociedade.
Kid A/Amnesiac (2000/2001) já captavam o inicio do novo milênio, as tensões da modernidade e o homem no centro desse fato.
Musicalmente os discos gêmeos estavam soterrados pela influência do free jazz de Alice Coltrane, pelo jazz cabeçudo de Charles Mingus e Miles Davis. Além da referencia ao krautrock de Can, faust e o os artistas da gravadora Warp, ainda que essa influência seja dita pelos quatro cantos como fundamental, os discos estão longe de serem discos eletrônicos, é um apanhado de influências que tornam discos herméticos e inclassificáveis.
Hail to the thief (2003) já ressoava com o abalo de um 11 de setembro que mudou a cara do mundo, rechaçou crises entre o oriente e o império americano, trouxe tensão e se tornou mais visível as máscaras do capitalismo. Tudo isso é captado de maneira metafórica no disco, considerado por muitos o mais "perdido" musicalmente, tese que os próprios membros da banda realçam por ele ter sido gravado muito apressadamente.
Mas musicalmente Hail to the thief reúne canções e coesa de difícil acesso, peças que foram retrabalhadas no extenso arsenal de sons da turma, um disco influenciado pela leitura de "Capitalismo e esquizofrenia" e "1984". Yorke nesse disco é como nós, mais um número no processo e aceita isso numa passividade agonizante.
Depois a banda encerra seu contrato com a EMI e lança-se independente. Captando as tensões num ciberespaço entre downloads e gravadoras, Thom & Cia são so primeiros da turma dos “grandes” a tratar o tema e não só isso, capta o momento delicado que a arte se encontra. In Rainbows (2007) poderia ser comprado com o preço que o comprador quisesse pagar ou até de graça, no geral, você refletiva o “valor” que a arte do grupo tinha pra você., forçando a pensar: Qual a o valor da arte nos tempos atuais?.
O estrondo foi grande numa mídia sempre sedenta por polêmicas e discussões. Musicalmente, o disco é nos ouvidos mais desavisados o mais acessível em tempos, suas canções parece ter sido esculpidas de tal maneira que não soam com nada parecido nos dias de hoje. Para chegar nesse fato a banda se atormentou e quase desiste e encerra suas atividades.
in Rainbows foi um marco estético, comercial, crítica e público, se renderam.
Pra onde ir?
Nos tempos de downloads intensos, motins virtuais, wikiliers,  gravadoras afundando, músicas e bandas de plástico, um mundo desencantado bate a nossa porta como um vento e bagunça nossa alma.
Qual o papel da arte nisso tudo?.
Qual o sentido de fazer música?
É nesse sentido que a banda nos apresenta seu oitavo filho.
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The King Of Limbs.
A criação de um sonho cantado como se real fosse e vivido em pouco mais de 37 minutos de um passeio por um lugar que nem lembramos mais. Nós mesmos.
A experiência de ouvir um Radiohead requer paciência, estar aberto a outras soluções para uma canção, outros andamentos, por vezes canções sem refrão, dissonância e quebras rítmicas pontuam uma turma inquieta e que mesmo com mais de 20 anos na estrada não se rende.
E sim, The King of limbs reúne uma banda disposta ao desequilíbrio.
Não, não é uma volta ao universo de Kid A/Amnesiac.
Nem ao estruturalismo que agrada os fãs de um rock mais escultural como o de Ok Computer. Também não é um novo In Rainbows é simplesmente uma obra única, fechada em si, de uma banda que inventou seu universo e gira sobre ele.

"Bloom" abre krautrokanamente. O piano elétrico (que ressoa a canção inteira) flutua (lembrando os primeiros discos dos alemães do Popol Vuh) e envolve os ouvidos, alguns segundos de loops de batidas até surgir um Phil selway alucinado (assim como em Morning Bell/Dollars and cents/Mixomatosis/15 step) num outro andamento, ainda por cima, o baixo do Colin em poucas notas pontua a entrada de thom (colin parece que gravou o baixo de um outro canal em marte) e permeia um thom em vocal chapante. Uma orquestração à la Alice coltrane ergue o clima,  a atmosfera de um florescimento lento.  "Abra sua boca" canta yorke, parecendo sobrevoar um descampado, possuído pelos mais intensos sonhos.
O free jazz continua em MorningMrMagpie. The king of limbs nos apresenta uma banda sinistra, A guitarra de jonny greenwood nunca antes tocada assim e de forma abafada entrecorta a tensão de uma bateria num compasso impenetrável, Phil realmente está na sua melhor forma. "Você tem muita coragem pra vir até aqui Você tem muita coragem pra vir até aqui" dispara Yorke entre setas, descompassos, tensão raivosa e lisérgica, a canção corre, free jazz /krautrock, tudo guiado pelo intenso frotman que não descansa. Pelo meio um violão bêbado dialoga num esquina solitária da canção. Tudo parece que vai se desprender do chão e colidir com alguma parede invisível mas estranhamente a canção se mantem, algo a faz se unir, um milagre jazz...
"Você roubou toda a minha magia E levou minha melodia".
Violão, baixo, bateria marciana e um lindo vocal permeia a bela  LittleByLittle. Canção que Jonny quase que solfeja as notas, enquanto Colin destila sua linha passeando por dentro da melodia ondulante e cheia de variantes com um Phil linear como se estivesse em outra freqüência.
"Obrigação, Complicação, Rotinas e horários, Droga e te mata Te mata"
Dispara um yorke confessional, que como num sonho, não quer acordar agora, o mundo de hoje exige mais do que viver, exige e te suga a alma.
A instrumental Feral (selvagem) parece um banda que não consegue encontrar sua razão. A melodia parece presa, Yorke tenta cantar algo mais tudo é abafado, incompleto, não há sentimento, a selvageria dos loops, o baixo do Colin que impregna, causa incomodação, aflição, thom parece um Cyborg se debatendo no meio de uma floresta.

LotusFlower nos apresenta para a segunda parte do disco. Seqüenciadores comandados por Jonny Greenwood, teclados gelados e um baixo sedutor (assim como em Nude e All i Need) realçam a cristalização de um vocal que parece que engoliu uma um luz desconhecida que da vida num falsete épico.
"Há um espaço vazio no meu coração onde cresce o mato
E agora eu vou te libertar, te libertar"
A bateria sempre incomum de Phil e os loops no vocal de Thomas evidencia uma das canções onde os Radiohead mais estão a vontade nesse disco. Recriando dentro da própria sonoridade que eles inventaram pra si, o cunho de originalidade que lhes é caro.
Desde de Amnesiac o Radiohead vem trabalhando peças minimalistas ao piano. Canções como pirâmide Song, sail to the Moon, Videotape, mostram um Yorke dissonante ao piano, sempre buscando fugir dos velhos clichês de canções assim, sempre com compassos improváveis e pouco refrão, a influência do jazz é visível mas toda as belezas anteriores , as tensões, os medos, a angustia de não-ser ,deságuam na peça de rara poética  de "Codex".
No ambiente frio de Lotus,  Yorke é transportado (assim assim como Pull/revolving door e You and army) para uma contemplação imensurável. Ele mergulha numa nuvem, descansa, deita sobre as folhas sem machuca-las e ouve os compassos mais íntimos da natureza.
"Deslize suas mãos
Salte no final
As águas são límpidas
E inocentes
As águas são límpidas
E inocentes"
Canta thom querendo que nós façamos parte da experiência. Quase como de onde o ponto que paramos em Pirâmide Song (onde não havia mais nada a temer nem a duvidar) somos tocados por uma canção irretocável, uma orquestra comandada por Jonny Greenwood, pontua a beleza e a sensibilidade em forma de canção. Os rapazes de Oxford, donos de canções como Boolet Prof. I Was, Street espirit., No surprises, Desappear Completely, Scatterbrain, assinam mais um ato sublime no imaginário da poesia moderna. E tudo encerra-se entre pássaros, caindo a tarde ou chegando o outono em "GiveUpTheGhost"
O verso:
"Não me assombre, não me machuque
Não me assombre, não me machuque"
Repete-se pela canção inteira, cantando um yorke sabendo que logo acordará, logo terá que lidar com as razões que ditam as regras desse mundo,
logo seu sonho terá que da lugar ao que chamam de "realidade". O sentimento de não fazer parte de um todo mais uma vez eclipsia um artista inquieto, uma eterna busca quase espiritual por uma zona que não seja de conforto e sim de consolação, uma das bases e buscas de toda a poesia desse trovador solitário em todos os discos da banda. Yorke lagrima e nos prepara para a separação onírica em "Separator".
Encerrar bem seus discos sempre foi uma especialidade dos Radiohead.
Parece que a última canção sempre trouxe uma beleza a mais, um delírio e uma certeza que reafirma toda a obra.
E não foi diferente com Separator.
A banda toda retorna, Jonny Greewood experimenta tensões na guitarra, Enquanto Phil passeia numa andamentos só seu, seqüenciadores distorcem a voz de Yorke que parece estar em outra freqüência, distante, num conforto de alguém que viveu um sonho bom e vive a memória cheia de saudades sublimes que o fazem voltar sempre que quiser. Pelo caminho um solinho na guitarra do Jonny que depois cresce, tornando-se as asas invisível de Thomas, um Thomas de rosto afagado pelos ventos, que acordou de um universo só seus mas o que antes era um sentimento de desconsolo crônico agora pousa na sua retina a máxima que o sentir é eterno.
A arte está aí para isso, te fazer sentir de novo, te fazer acreditar que um sonho é possível num mundo onde o desalento recria a certeza da falta de encanto nas coisas vividas. O arranjo de guitarra no final é uma dos mais belos da discografia da banda e encerra em meio ao apelo do Thomas-poeta para acorda-ló da nossa própria realidade. Uma das grandes obras de artes da obra do grupo desde sempre.
"É como se eu estivesse caindo da cama
Depois de um sonho longo e fatigante
Finalmente me livrei do peso que carregava
Quando eu pedir de novo
Quando eu pedir de novo
Me acorde
Me acorde"
The king Of limbs é um passeio solitário pelo sonho de um poeta.
O sonho de um mundo como ele queria que fosse,  um sonho de alguém  que acredita nas relações entre homem e natureza, alguém que ainda sente o prazer irreparável de observar um flor, apreciar a beleza de um pássaro ou o correr de um rio, algo que perdemos em tempos de internet, relações banalizadas, amores descartáveis, arte que não comove apenas preenche o intervalo do almoço ou serve para nao causar tédio.
Um mundo que desbota aos poucos e onde fazer arte que não seja apenas por mera arte, requer paciência, trabalho, requer  certeza dentro de si que de alguma forma, uma obra terá alguma razão na vida de alguém.
Musicalmente o oitavo disco dos Radiohead abraça numa parte o Free Jazz de Alice Coltrane e o Krautrock do Faust, um passo a frente nos experiências anteriores, numa banda segura para não seguir fórmulas. Na segunda parte, o velho e inominável Radiohead, com sua dissonância, orquestrações e beleza, alguns loops e samples apenas como complemente, ao contrário do que andam afirmando, o disco tem pouca coisa de eletrônica, além de um fluidez e fragmentação orgânica que pode soar eletrônica em alguns ouvidos.
O Radiohead segue compondo obras primas e nos comove com sua sublimação absoluta.
O poder da sutileza em estado de graça dialogando com a natureza mais elementar.
Parabéns a banda por captar nosso tempo assim e nos entregar mais um documento.
Canções que serão milenares tanto quanto o carvalho que inspirou o título do disco.

Por: Cybernic

In Rainbows


(2007) Radiohead – In Rainbows
Track list:
CD 1
1. “15 Step” – 3:58
2. “Bodysnatchers” – 4:02
3. “Nude” – 4:15
4. “Weird Fishes/Arpeggi” – 5:18
5. “All I Need” – 3:48
6. “Faust Arp” – 2:09
7. “Reckoner” – 4:50
8. “House of Cards” – 5:28
9. “Jigsaw Falling into Place” – 4:09
10. “Videotape” – 4:42
CD 2
1. “MK 1″ – 1:04
2. “Down Is the New Up” – 4:59
3. “Go Slowly” – 3:48
4. “MK 2″ – 0:53
5. “Last Flowers” – 4:27
6. “Up on the Ladder” – 4:17
7. “Bangers + Mash” – 3:20
8. “4 Minute Warning” – 4:06

Por Alexandre Matias
Vamos falar a verdade – o Radiohead só passou a existir a partir do segundo semestre de 1997, quando OK Computer definiu uma fronteira ainda inconsciente. Ali terminava a carreira de uma banda do terceiro escalão da geração britpop, que se esforçava para suprir a lacuna deixada pelo U2 à medida em que Bono e companhia mergulhavam na dance music. Mesmo com algumas boas faixas em The Bends, o Radiohead era menos do que nota de rodapé na história do rock, fadado a ser lembrado mais por “Creep” do que por faixas infinitamente superiores, como “High and Dry”, “Fake Plastic Trees” ou “Just”. Até que, em um disco, mudaram completamente a abordagem de sua música, sua própria noção de importância e a consciência de perspectiva histórica. OK Computer era uma coleção de faixas que soavam tão inquietas quanto clássicos do rock, devendo tanto ao stress existencialista da geração X e à paranóia consumista dos anos 90 quanto aos discos solo dos Beatles e os discos certos do rock progressivo. E toda poeira retrô que pairava sobre as canções do último álbum da história do rock soa setentista ao mesmo tempo em que flutua pós-moderna, como se letra e música fossem atiradas à ausência de gravidade e humanidade de uma etapa cinzenta a seguir. Imagine o estado da banda ao conduzir versões com 14 minutos de uma “Paranoid Android” ainda não gravada para o público da primeira turnê americana de Alanis Morrissette, de quem foram o show de abertura.
Mal sabíamos como aquele OK Computer seria definitivo: surrupiada de Douglas Adams, a frase funcionava como um epitáfio para o mundo pop como o conhecíamos, de artistas inatingíveis, canções que soam como hinos, discos para serem ouvidos de cabo a rabo, a indústria fonográfica em particular e o mercado de entretenimento como um todo. Tudo começaria a ruir naquele semestre. Ao mesmo tempo em que as letras da banda pareciam concretizar-se, novas estradas digitais eram erguidas. A ausência de resistência do título não era apenas um último suspiro, uma trégua final – também anunciava o início de novas regras no jogo do pop. Afinal, o computador não era apenas a caixa cinzenta de plástico que passaria a nos conectar através de uma rede neurológica planetária artificial, mas também cada um de seus usuários. Ao ceder ao computador, a banda estava encerrando também o ciclo de relação da banda com o ouvinte passivo, afinal, a partir dali ele também inseriria dados na equação do sucesso de determinado artista que iam além da simples compra de ingressos ou de discos.
O próprio Radiohead foi cobaia desta nova realidade ao ver o disco posterior a OK Computer aparecer online antes de ter sido lançado. Três anos após ter subido degraus consideráveis em importância no mundo pop graças a um único disco, o Radiohead armava a contagem regressiva para o lançamento de um disco que a indústria esperava ser campeão de vendas com notícias que diziam que o disco seria hermético e experimental. E a expectativa aumentava quando gravações com as novas faixas tocadas em shows começaram a aparecer na internet –que culminou com o próprio vazamento de Kid A quase dois meses antes de seu lançamento oficial. Aquela novidade era uma prática que já vinha acontecendo com artistas menores, mas, com a chegada do Radiohead ao primeiro escalão do pop, abriu as possibilidades de ver a internet como vilã, ao minar as possibilidades de um artista de grande porte vender ainda mais discos. O resultado foi um esgar inicial à complexidade e densidade das canções, avessas ao classicismo de OK Computer, que rendeu notícias anunciando a morte prematura do disco. Mas foi o tempo necessário para o público digerir o álbum e seu conceito antipop para que Kid A, contrariando todas expectativas, se tornasse um dos discos mais vendidos do ano 2000 no mundo inteiro.
Com Kid A, o grupo virou as costas para o que havia pregado em OK Computer e partiu para o que mais havia de vanguarda na época. Lembro da Wire, bíblia da música experimental, estampar Thom Yorke em sua capa com um misto de admiração e culpa, pois a banda de rock mais popular do planeta tinha levado para seu aguardado disco parte do universo de exploração e experimentos endeusados pela revista. A música mais “fácil” de Kid A não ajudava muito, ao criar um neologismo que fundia idiotice com discothéque, numa crítica nada sutil à pista de dança. Pesado e de poucos amigos, Kid A é um salto no escuro tão radical quanto os álbuns negros do Prince e do Metallica – embora não tenha errado tanto quanto o primeiro nem acertado tanto quanto o último. Em seu quarto disco, o Radiohead tinha deixado de ser uma banda pop aspirando o Olimpo para assumir a expressão de uma esfinge, uma Mona Lisa de olhos tortos que ri de/com/para algo – e você não sabe do quê.
Os discos seguintes continuaram a trilha, abrindo-a para os lados. Amnesiac é o lado B de Kid A e o disco ao vivo I Might Be Wrong compila as músicas dos discos anteriores que poderiam ter feito o sucessor de OK Computer um disco palatável – mas desimportante por ser muito parecido. Com Hail to the Thief, eles ampliam ainda mais suas discussões ao assumir posições políticas ao mesmo tempo em que costuram o experimentalismo com sua maior qualidade, as canções.
Sete anos depois do abismo Kid A, o grupo dá um passo ainda mais ousado - talvez até mesmo que o de OK Computer. Tudo estaria resolvido em menos de um mês. Em setembro de 2007, pouco se falava sobre o próximo disco do Radiohead e no mês seguinte a banda dominava o imaginário mundial. Começou com o mínimo de barulho num site chamadowww.radiohead7lp.com, que computava uma contagem regressiva para alguma coisa. Sim, era o sétimo disco do Radiohead que estava para ser lançado, mas logo a própria banda vinha em seu site para dizer que não tinha nada a ver com aquela contagem regressiva. Em alguns posts anteriores, o grupo apenas lançava mensagens enigmáticas, criptografadas – uma delas foi traduzida como sendo MARCH WAX, o que levava a crer que o próximo disco da banda sairia apenas em vinil, seis meses depois.
Ou não. Eis que o tal cronômetro chegou ao zero, revelando a frase - THE MOST GIGANTIC LYING HOAX OF ALL TIME (O MAIS GIGANTE E MENTIROSO BOATO DE TODOS OS TEMPOS, tudo em caixa alta mesmo) linkada a um vídeo do YouTube, que nos fazia cair no clipe de “Never Gonna Give You Up”, de Rick Astley, num primeiríssimo Rick Roll’d em larga escala. Ao mesmo tempo, o próprio site da banda revelava a seguinte mensagem:
“Hello everyone.
Well, the new album is finished, and it’s coming out in 10 days;
We’ve called it In Rainbows.
Love from us all.
Jonny”
Dali você era redirecionado para o site InRainbows.com, que escreveria uma nova página na história do capitalismo. No momento em que você optava por comprar o álbum, o site lhe oferecia a opção de escolher o preço que queria pagar. Não era simples altruísmo: assim, o que o Radiohead admitia era o fato de que, uma vez feito, o disco já estava lançado – pagaria quem se dispusesse a faze-lo. Mais do que ter o preço avaliado pelo comprador – o que é um conceito inovador em si –, In Rainbows foi dado de graça. Quem quisesse, poderia pagar pela comodidade de receber, além das dez faixas disponibilizadas em MP3, um pacote com o disco em vinil em edição especial, que ainda incluía um disco extra. Calibrando suas faixas com um bitrate específico (160 – ao contrário dos 320, 192 ou 128 que são usados como padrões), eles logo dominavam a rede com o mesmo disco em milhões de HDs diferentes. Ao contrário do vazamento involuntário, que pode pular uma das etapas do processo de produção do disco e vir com algo menos (títulos definitivos, masterização, ordem das músicas, etc.), In Rainbows chegou inteiro e ao mesmo tempo para todo seu público – e exatamente como queriam seus autores. Em um fim de semana, o sétimo disco do Radiohead deixava de ser uma conspiração decodificada por fãs para se tornar um novo paradigma para a cultura pop.
In Rainbows ainda tem outro mérito – o de mostrar que download gratuito não pressupõe pirataria, como desinformava a guerra de nervos promovida pela indústria do disco no início da década, quando insistia em jogar na internet a culpa da má gestão de seus próprios negócios nos anos 90 e trata-la como vilã. Assim, se uma incauta geração inteira baixava MP3 como se não houvesse amanhã, outra, precavida, comprava seus MP3 com medo de prejudicar seus artistas favoritos. O Radiohead deu a esta última a chance de baixar não apenas uma música, mas um disco inteiro, de um artista estabelecido – de graça, sem dor.
O feito transformou o Radiohead em novo paradigma digital. Não apenas o universo musical, mas todos conscientes do papel da internet ouviram falar da nova estratégia da banda, que em uma semana, teve mais de um milhão de downloads só do site oficial, dominou a parada da Last.fm e apresentou-se para gente que nunca tinha sequer parado para ouvir o grupo. Além de impulsionar uma safra de artistas a adotar o formato.
Há quem desmereça o feito como mero recurso técnico feito para distrair a atenção da essência artística – reação usada para esvaziar os efeitos de Guerra nas Estrelas ou de Dark Side of the Moon, a cor em O Mágico de Oz, a pompa de Sgt. Pepper’s, o timbre de João Gilberto, a falta de respostas em Lost ou a filosofia de araque em Matrix. Os detratores do pop desvinculam tais elementos de suas obras originais de forma a torná-los ridículos para quem acompanha o fenômeno de fora, sem perceber que é justamente esse o elemento responsável por ampliar o público para longe do nicho, rumo às massas. E por mais óbvio que pareça ter sido o salto dado por In Rainbows, ele foi crucial, pois quebrou o parâmetro linear de produção da era analógica, que inevitavelmente faria o disco ser lançado mesmo em março de 2008, caso a banda entregasse o disco à gravadora, e não ao público. A sensação de desnorteamento foi tamanha, que havia quem considerasse o lançamento digital do disco um híbrido improvável batizado de “vazamento oficial” – sem perceber a contradição no termo. Como provocação, a banda ainda marcou o lançamento oficial do CD para o primeiro dia de 2008 – como se perguntasse a quem falou em “vazamento oficial” de quando é que eles vão datar o CD, 2007 ou 2008? Endossando a provocação, o Radiohead ainda fechou um acordo com a CurrenTV de Al Gore para transmitir um show gravado no estúdio da banda no último dia de 2007. Poucas horas antes do disco chegar às prateleiras das lojas do mundo, milhares de fãs da banda em todo o planeta cantavam todas as músicas de um disco que ainda não existira fisicamente, apenas de forma digital.
Mas o fato é que todo esse rebuliço não seria tão importante caso In Rainbows não fosse bom. Tanto que logo depois o Nine Inch Nails lançou um disco de forma ainda mais ousada – tanto em termos mercadológicos quanto em se tratando de narrativa – e ninguém mal ouviu falar do disco. Por que é ruim? Não, afinal de contas, o trabalho de Trent Reznor é sério. Mas por que não se conecta de forma tão intensa com a própria época como o do Radiohead.
E chamar In Rainbows de um bom disco é exagerar na modéstia. In Rainbows é o melhor álbum dos anos 00.
Pois todo experimentalismo da virada do milênio já havia sido digerido pela própria banda. Expurgando a possibilidade de se repetir ao cogitar discos de vanguarda em vez de álbuns de rock, o Radiohead aos poucos abandona a experimentação e o improviso, rumo ao artesanato cancioneiro. As texturas e timbres alienígenas de Kid A/Amnesiac surgem nas entrelinhas, nos arranjos, nos detalhes de In Rainbows – que é, essencialmente, uma continuação de OK Computer. Há uma linha de raciocínio que inclusive busca ligar ambos discos e fãs do grupo são instigados a procurar sentido em coincidências como o fato dos dois discos serem batizados com expressões com duas palavras, uma com duas letras e outra com oito. Já cogitaram até mesmo que a audição entrelaçada das faixas dos dois discos abre uma nova dimensão entre suas canções – mas o efeito é mais lúdico do que racional e poderia funcionar com quaisquer faixas dos últimos discos da banda (sinal da coesão de sua sonoridade). Mas há ainda quem veja coincidências nos detalhes – e há uma ênfase no número 10 que sugere alguma referência à linguagem binária no Código Radiohead. Além dos discos terem 10 faixas cada (OK Computer tem doze, sendo que uma, “Fitter Happier”, é um interlúdio), OK Computer e In Rainbows foram lançados com dez anos de diferença entre si – e o último lançado exatamente no dia 10 de outubro (o mês 10) de 2007. E mais: o fato do título dos discos começarem com as letras “O” e “I” também seria outro aceno ao código binário. “Down is the New Up” – parece que tem mesmo algo aí.
Mas, principalmente, há a música – e ela se mostra a princípio hermética. In Rainbows abre fechando-se com uma rajada de beats tortos, primos da gravadora Warp, que tanto bateu no grupo no início da década. “Como posso terminar onde comecei?”, pergunta-se Yorke, sem se preocupar em nos dar as boas vindas. “15 Step” aparentemente nos guia para outro beco sem saída experimental. Mas aos 40 segundos, deixa a guitarra jazzista de Jonny Greenwood superpor-se à percussão esquizofrênica – e a de Ed O’Brien logo surge funcionando como segunda voz, junto com uma sinuosa linha de baixo e uma melodia direta e reta, oposta a seus versos de abertura. “Tudo estava bem/ O que aconteceu? O gato comeu sua língua?”, pergunta o vocalista sobre a mudez espiritual de nosso tempo. “Etc. etc./ Fatos ou o que for”. O clima apático e tenso parece dissolver-se numa melancolia pós-milênio que filtra todo o disco – um sentimento que é um vazio existencialista parente da apatia cantada por Kurt Cobain e de um blues robô, que une Kraftwerk, Daft Punk, Aphex Twin e Brian Eno numa espécie de eletrônica autoral, em que o ritmo tem mais sentido do que sensação. Mas se essa sensação oca era a mesma que causava desespero e náusea em OK Computer, em In Rainbows ela parece menos caótica e mais precisa – como se tivesse completado um ciclo (os “15 passos” seriam um programa?).
“Bodysnatchers” segue dura e rock, com seu riff distorcido conduzindo o ritmo como um cavalo selvagem, acompanhado em seguida por toda a banda. Esta alterna entre o pique inicial (cuja letra revela seu protagonista catatônico – “pisque seus olhos/ Uma vez para ‘sim’/ Duas vezes para ‘não’/ Eu não faço idéia do que você esteja falando”) e uma clareira de ritmo, quase zen, quando uma guitarra saída de um disco do Cure ou um teclado fantasmagórico sublinha os gemidos de Yorke. “A luz apagou pra você?/ Pra mim, apagou/ É o século 21”, canta numa performance, que vai do grunhidos ao sussurro, sua voz tão solta na parte final da canção como qualquer outro instrumento da banda, tão importante à formação sonora quanto as três guitarras, os teclados ou a cozinha decidida – e é ela quem encerra a faixa repetindo “eles estão vindo!”, como se impressionada com a coesão e força da usina de som que lidera, logo depois de concluir “eu estou vivo”.
“Nude”, conhecida pelos fãs de shows com outro título, “Big Ideas”, começa superpondo vocais, samples de corais, cordas sintéticas para criar um clima de catedral, que é logo esvaziado – deixando apenas Yorke com o baixo de Colin Greenwood e a bateria de Phil Selway, criando uma atmosfera bucólica e tranqüila (embora a letra cante que por mais que você se apronte,“sempre algo estará faltando”), em que as duas guitarras entram como se fossem uma só, alternando detalhes dedilhados como nas baladas mais hipnóticas do Velvet Underground ou as canções mais pastoris do Pink Floyd. E logo essa estrutura instrumental serve como base para as mesmas cordas, samples e vocais que abriram a canção voltarem – e quando Yorke deixa sua voz soar sem letra, há um minuto do fim, estamos ouvindo um dos trechos musicais mais bonitos de nossa época, quase uma revelação sentimental, sentimentos que só a música consegue traduzir – palavras falham.
O disco retoma à contagem de tempo antes da bateria assumir o ritmo incessante kraut que funciona como tela em branco para três guitarras superporem dedilhados, completando-se em “Weird Fishes/Arpeggi”. Não consigo dissociar não apenas essa faixa, mas diversos momentos de In Rainbows, da descoberta do violão feita pelo Legião Urbana em seu segundo disco – até porque a própria trajetória do Radiohead ultrapassa um arquétipo vivido pelo grupo de Renato Russo, que é quando uma banda guitarreira descobre a eficácia da harmonia em detrimento do ritmo e a sutileza do instrumento acústico em contraste à histeria elétrica. “Weird Fishes” é parente bastarda de “Andréa Doria” e “Plantas Debaixo do Aquário”, as mesmas texturas instrumentais, mesma sensação de esperança disfarçada de desespero, mesma abordagem temática do mar (Andréa Doria era o nome de um barco italiano que afundou em 1956, perto de Nova York).
De andamento quase fúnebre, “All I Need” é outra bomba-relógio – ela parece prenunciar uma música tensa e solene, quando, na verdade, é a balada mais pop que o grupo já fez; uma canção pronta para aquecer corações, escorada em um arranjo com cara de Björk: bateria minimal, piano soturno, efeitos sonoros, ecos, muitos vazios. Ela termina em “Faust Arp”, uma microcanção em que o arranjo de cordas a deixa com ar ainda mais pastoril, nickdrakeano, onde o grupo faz valer seu anglicismo.
A linda “Reckoner” é outra música que vai sendo construída lentamente entre nossos ouvidos, cada camada de instrumento sendo disposta de forma didática, nos ajudando a ouvir o que cada um faz na banda e nos explicando sentimentalmente o que é que precisa nos afeiçoar em uma canção para que ela torne-se universal – neste caso, apenas o andamento e a melodia, todo o resto é assessório. O vocal de Thom em especial deixa a aparente psicopatia de lado e atinge seu grande momento – em especial quando, na segunda parte da faixa, canta consigo mesmo e entoa, quase em segredo, o nome do disco. “House of Cards” não deixa cair – e vai pela mesma fórmula da canção anterior nos fisgando sem pensar. Desta vez o ritmo é determinado pela guitarra, que é apenas seguida pela bateria, deixando Thom Yorke ter seu outro grande momento, cantando em tom grave, oposto ao falsete de “Reckoner”. Há tanta referência – e reverência – ao folk dos anos 70 quanto à música ambient da virada do milênio, em outra canção irretocável.
“Jigsaw Falling Into Place” é o grande momento do disco, como se fosse uma “Paranoid Android” amadurecida em dez anos – as mudanças entre as faces da música são menos abruptas e suas diferentes caras soam complementares, não antagônicas. Ela aponta para uma certeza que toma conta do disco – de que estamos finalmente vendo as coisas do jeito que elas são. Caem as máscaras erguidas pela comunicação e aos poucos conseguimos ver quem é quem, como se o ataque de pânico de OK Computer fosse substituído por uma sabedoria cínica, algo Tyler Durden, um sociopata disposto a derrubar tudo por dentro – a princípio o tom é sóbrio:
“Logo que você segura minha mão
Logo que você anota o número
Logo que as bebidas chegam
Logo que eles tocam sua música favorita
A mágica desaparece”
A letra continua dissecando toda a tensão da sociedade moderna do mesmo jeito em que a banda cresce – instrumentos acústicos e vocais que cantarolam começam a ser trocados por berros, solos de guitarra e cordas dramáticas e a música ganha um volume e densidade que no início era apenas referido. A letra invade um outro país das maravilhas de Alice, de paredes que perdem forma e gatos que sorriem mas também de ruído, ritmo e câmeras de circuito fechado. “Nunca fui lá/ Só fingi que fui”, “antes que você entre em coma/ Antes que você fuja de mim”, “Pra que servem instrumentos?/ Palavras são armas de cano serrado”, Yorke nos induz ao transe dervixe inglês antes de sentenciar que o quebra-cabeças começa a fazer sentido: “As peças se encaixam/ Não há nada a ser explicado”, canta como um guru psicodélico que guia um novato em uma viagem alucinógena – mas a viagem que a banda propõe é justamente abandonar o excesso de referências que polui e superlota nossas cabeças para “desejar que o pesadelo se vá”, pois “você tem uma luz e pode senti-la”. E ele não está sendo esotérico, como dá pra perceber.
“Videotape”, devagar quase parando, encerra o disco com a melancolia de um velho VHS, Thom Yorke vê-se póstumo ainda querendo ater-se à vida que acabou de perder (“quando eu chegar às portas do céu/ Isso estará gravado em vídeo/ Mefistófeles logo abaixo/ Tentando me puxar”), nos fazendo pensar em nostalgia e como nos apegamos mais ao passado do que ao presente. Os acordes congelados ao piano são emoldurados por ruídos e texturas, sem nunca superpor-se à canção.
In Rainbows é um conjunto perfeito de 10 canções perfeitas. Elas conversam entre si exatamente como falam das sensações que todos sentimos nos dias de hoje – um medo opressor cuja natureza é indeterminada, a tensão de ser humano – animal ou racional? – na medida em que a civilização entra em colapso, uma sensação vazia que se sobrepõe ao excesso de tudo. São os mesmos sentimentos desenhados em OK Computer, o que muda é a relação da banda com eles – se no primeiro disco parecia espantar-se e cogitar o suicídio, neste percebe que todo o ruído e poluição é só a casca de uma pseudo-realidade – e que o que há por trás do excesso de informações e caos de consciência que distorce nossa rotina é muito simples, claro e fácil.
Alie isso ao fato de In Rainbows não ser um disco de inéditas. Conhecidas de seu público através de shows, todas as faixas já haviam aparecido mais de uma vez e já tinham vídeos no YouTube, letras em sites de fã e seqüências de acordes em repositórios online de canções cifradas para violão. Não era seu ineditismo que as tornava especiais em In Rainbows – mas a forma em que elas foram dispostas, sua produção, seus arranjos, o sentido que fizeram umas juntas às outras. Uma outra leva de músicas ainda podia ter se juntado à coleção inicial mas terminou como uma espécie de conteúdo extra – o segundo disco do vinil duplo vendido através do site – mas que, quis o destino, não era In Rainbows.
In Rainbows é um conceito fechado, uma declaração de princípios, um manifesto estético. Mais do que um disco que assumiu-se digital por natureza e copiável por definição, é uma coleção de canções que não apenas traduzem certas sensações que permeiam nosso dia a dia, como faz isso com estilo, bom gosto, senso de importância e perspectiva histórica. Uma obra que ainda faz valer a existência de um formato, a prova de que o fim do CD não pressupõe o fim do álbum. E, por tudo isso, é o disco mais importante da década.
Nos anos 90, o Radiohead não chegou perto deste título pois seus padrões foram estabelecidos logo no início – e OK Computer teria de competir com obras-prima como Blue Lines, Nevermind, Check Your Head, Loveless, The Chronic, Screamadelica e BloodSugarSexMagick. A década seguinte também talhou seu modus operandi de cara – e, desde o início, descartou o álbum como formato. Medidos em canções, os anos 00 esvaziaram o formato álbum de diferentes formas – de bandas que movimentam-se exclusivamente por singles (como toda a geração novo rock nascida após os Strokes) a artistas que se lançam por etapas, adicionando elementos extra à medida em que envolvem o ouvinte (pense nas carreiras de Dangermouse, Jack White, Marcelo Camelo ou Nick Cave – e suas muitas camadas de apresentação ao público). Quando o Radiohead se propôs a lançar In Rainbows como o lançou, sabia onde queria estar.

Hail To The Thief


(2003) Radiohead – Hail To The Thief
Track list:
1. “2 + 2 = 5 (The Lukewarm.)” – 3:19
2. “Sit down. Stand up. (Snakes & Ladders.)” – 4:19
3. “Sail to the Moon. (Brush the Cobwebs out of the Sky.)” – 4:18
4. “Backdrifts. (Honeymoon is Over.)” – 5:22
5. “Go to Sleep. (Little Man being Erased.)” – 3:21
6. “Where I End and You Begin. (The Sky is Falling in.)” – 4:29
7. “We suck Young Blood. (Your Time is Up.)” – 4:56
8. “The Gloaming. (Softly Open our Mouths in the Cold.)” – 3:32
9. “There there. (The Boney King of Nowhere.)” – 5:23
10. “I will. (No man’s Land.)” – 1:59
11. “A Punchup at a Wedding. (No no no no no no no no.)” – 4:57
12. “Myxomatosis. (Judge, Jury & Executioner.)” – 3:52
13. “Scatterbrain. (As Dead as Leaves.)” – 3:21
14. “A Wolf at the Door. (It Girl. Rag Doll.)” – 3:23


HAIL TO THE THIEF
Sim, é ele. Sentado à beira da sua mesa de pinho escandinavo, de ombros caídos e cotovelos enterrados no tampo. Baloiça pesadamente na cadeira com rodas – revestida a coro preto (lavável), armação em alumínio, apoio lombar, 5 posições predefinidas e mais 3 programáveis. Os pés batem no linóleo do escritório num ritmo ansioso. A impaciência junta com o calor provocam suores desconfortáveis, gotas quentes que percorrem a face e descem pelo pescoço para morrer no colarinho da camisa apertada até ao último botão. Amílcar sente-se demasiado sonolento para se preocupar com o que quer que seja. Bebe mais um café.
São quase 6 da tarde quando chega o estafeta à redacção da publicação musical onde o nosso crítico trabalha – ou exercita a caligrafia em exercícios de estilo aleatórios, críticas a discos e uma coluna ao lado dos anúncios. De uniforme preto colado ao corpo e acne crónica a decorar a cara, o jovem entrega a encomenda tão esperada: o novo disco dos Radiohead está agora nas suas mãos e o crítico não consegue deixar de salivar em antecipação. De maneira pouco discreta rasga o papel pardo e exibe a capa para o resto da redacção que permanece distante e desinteressada. A caminho do seu gabinete alguém lhe pede: depois diz-me se é melhor que o novo de Coldplay ou de Muse. Amílcar não se apercebeu da identidade do autor da chalaça mas pelo sim pelo não enviou um manguito (na verdade o que ele fez foi mandar uma valente caralhada, o manguito é a forma mais meiga e antiquada do gesto – a proto-caralhada. Manguito é mais bonito, não podia deixar de usar essa palavra aqui ) esvoaçando pelo ar viciado da redacção na esperança de eventualmente atingir o blasfemo.
Fechada que está a porta do gabinete, Amílcar retira o disco da embalagem e coloca-o na aparelhagem que ainda está a pagar: dolby surround, som digital stereo 5.1 e acabamentos em pinho. Perde tempo à procura do botão play, mexe no equalizador, perde a paciência, carrega em vários botões aleatoriamente, vai chamar o tipo das fotocópias – um estagiário de 19 anos que por ser mais novo tem por obrigação saber mexer nestas coisas (e que dizem que anda a comer a Lizete da contabilidade). Enquanto espera que o seu problema se resolva, observa deliciado o livrete. É sempre fantástico o artwork de Stanley Donwood, desta vez mais colorido. A banda junta agora as letras à restante informação, o que tira a piada toda a quem gosta de rir à gargalhada com os missearings dos outros espectadores durante os concertos.
O disco começa finalmente a tocar, acende um cigarro, pega no bloco de notas e numa caneta vermelha. Vai começar:
“2+2= 5”: as guitarras, a voz de Yorke tal como ele gosta, sim, está tudo no seu devido lugar. Amílcar sorri para dentro e começa a bater o pé. Aos 2 minutos a coisa torna-se mais interessante, surgem as guitarras e o baixo em crescendo, a voz torna-se descontrolada, teme-se o caos. O pé direito desiste do esforço de acompanhar o ritmo, Amílcar agora está confuso, sente-se atingido por qualquer coisa muito forte mas não sabe precisar o que foi, a música apenas dura 3 minutos mas o homem não sossega. Anota no caderninho: bom começo, estranho. a ouvir mais tarde. Comprar tabaco.
“Sit Down. Stand Up”: confirmam-se as expectativas, a voz não aparece pervertida por electrónicas ou sucedâneos, é mesmo a voz de Thom Yorke, aquela a que nos habituamos. A música vai progredindo e a batida, o piano, tudo puxa pelo crítico quarentão. Amílcar levanta-se e ensaia uma qualquer valsa errante pela sala. O ritmo aumenta e a música chama por ele de uma maneira prejudicial para a sua tensão arterial: agita os braços, esperneia e uiva desalmado. Exausto, atira-se para o cadeirão e anota: procurar esfignamanómetro lá em casa. Beber menos café. Isto começou muito bem.
“Sail to The Moon”: o nosso herói descansa, descalçou-se e embala o cheiro dos seus pés com uma música deliciosa. Lá está aquele piano outra vez, música simples e terna de uma beleza quase religiosa, alvar. Amílcar distrai-se com as nuvens lá fora, “oxalá chova”.
“Backdrifts”: nariz torcido, muitas caretas, ginástica facial justificada pela primeira grande incursão pela electrónica neste disco. A coluna da esquerda está a distorcer, Amílcar pragueja. Escreve: canção nº 4, não gosto. Arranjar piada com a palavra laptop.
“Go to Sleep”: aqui há uma guitarra acústica e um suspiro. Parece estranhamente deslocada, uma música bonita mas que não convence. No bloco de notas lê-se: Esta canção acaba com um fade out, tão 1993!!! Não esquecer de ir buscar o Martim à natação.
“Where I End and You Begin”: recomeça a bater o pé agora só com uma meia de polyester a cobri-lo. Canção com muito groove e uma linha de baixo bestial. Amílcar atira a caneta ao ar 3 vezes e apanha-a de forma acrobática – acha graça. Há quarta a caneta acaba no chão. Muitos ruídos, muitos sons preenchem uma paisagem que se adivinharia anárquica mas que no final revela uma harmonia desarmante. Não há anotações.
“We Suck Young Blood”: mais uma grande canção. Os Radiohead não estão a envelhecer nem a engordar, estão a crescer com classe. Por piores penteados que tenham tido, há momentos como este que nos fazem perdoar tudo. Amílcar apanha a caneta do chão e acha a canção minimalista e inane. Segundos depois está a acompanhar os coros e a balançar a cadeira de um lado como um pêndulo que acompanha o compasso. Acaba por reconhecer que é uma grande música e aos 3 minutos ao embarcar num delicioso delírio jazzistico, Amílcar desabotoa 3 botões da camisa. Amanhã vai estar a cantarolar isto na carruagem do comboio.
“The Gloaming”: é de estranhar a electrónica tão fria conseguir transportar-nos para universos tão belos e sentidos. Esta música é intensa e desconfortável num bom sentido. Assusta, persegue, cola-se à pele fria e boçal. O critico sente isso e mexe-se um sem número de vezes na cadeira à procura de posição. Ajusta a altura e inclinação. Despe a camisa que por esta hora se cola ao corpo como uma mortalha. Volta a apontar: estranha melodia em espiral. Tenho medo. Telefonar a pessoas que não vejo há muito que têm doenças com nomes estranhos.
“There There”: é o single, uma musica carregada de suspense, de tensão que se quebra no fim mas sem destruir aquela sensação de retenção anal. Tem passado pelas rádios com bastante assiduidade e deve ser por isso que não consegue surpreender neste momento. Amílcar sente-se mesmo tentado a passá-la à frente mas é uma grande canção e vale a pena. Aproveita para tirar os macacos do nariz , moldá-los numa bolinha na ponta dos dedos e atirar o mais longe possível. Um ficou na janela.
“I Will”: que coisa mais triste. Dois minutos de uma beleza dolente, asfixiante. Quando era mais novo, Amílcar inscrevera-se para as danças de salão que havia lá na paróquia, para impressionar uma vizinha 3 anos mais velha de quem ele gostava. O traje que era obrigado a usar nas competições ficava-lhe muito apertado, todos o gozavam. Aguentou dois anos mas depois desistiu, durante esse tempo todo só lhe falou 3 vezes. Lembra-se de todas, 40 anos depois. Ele finge que isso não o incomoda.
“A Punchup at a Wedding”: música repetitiva, aborrecida, balofa. Provavelmente o momento mais aborrecido. No caderno, Amílcar desenhou gaivotas, pássaros, um gato de gostas e o que parece ser um unicórnio cubista.
“Myxomatosis”: por qualquer razão que só a ciência saberá explicar, o nosso objecto de estudo está a dançar de uma maneira dessincronizada mas cheia de estilo. Mexe os braços e pernas freneticamente e parece-me descontrolado. As calças começam a pesar-lhe nas ancas e sem qualquer pudor, Amílcar desembaraça-se delas. Rendido à força bruta da linha de baixo que percorre toda a canção, vivem-se momentos de êxtase que este não sentia desde que lhe concederam estacionamento grátis no health club – que nunca frequenta.
“Scatterbrain”: respira fundo, uma, duas vezes. Está à janela, apenas com as cuecas e as meias vestidas. O vidro reflecte a sua a sua imagem: despenteado, suado, despido. Não importa, a música segue em jeito de banda sonora e abraça-o, envolve-o num manto diáfano de ternura e compreensão. Fixando o olhar no vazio, Amílcar faz um esforço para conter qualquer coisa que quer à força sair dos seus olhos. Deve ser mais um qualquer problema glandular, pensa. Marcar consulta para o endocrinologista, segunda-feira pela manhã, anota.
“Wolf at The Door”: diz que nunca foi dado a violência. Não, nem mesmo quando lhe batiam na escola por causa dos suspensórios ou da sua disfunção urinária, nem aí. Agora desenterrem Freud para explicar isto: o pisa-papéis saiu disparado contra o espelho, a cadeira desceu violentamente sobre a mesa, papéis voam e ele grita. A música (ainda a música) sobrepõe-se a tudo num canto ansioso e desesperado. Acompanha a raiva impossível de conter, o caos. Dá-lhe forma e atribui-lhe sentido, provoca, exige, implora. Três dicionários, um cinzeiro e parte de uma janela depois, Amílcar pára para respirar, surpreendentemente tranquilo, inegavelmente feliz. O disco acaba sem justificação aparente para aquilo tudo. A redacção assiste assustada àquele triste cenário sem saber o que dizer. Amílcar solta uma gloriosa gargalhada e foge para a rua.
Nunca mais apareceu na redacção, há quem diga que penhorou tudo, tirou um curso de ioga, comprou um cão e foi viver para uma cabana junto ao rio. Há quem afirme que tem uma retrosaria numa aldeia na beira interior. Seja como for, Amílcar é a prova acabada de que é muito difícil ficar-se indiferente a um disco como o Hail To The Thief e que o stress provocado pela vida moderna traz reumático, arteroses, conduz à perda prematura de cabelo e afectos.
Luís Miranda
a puta da subjectividade

Amnesiac


(2001) Radiohead – Amnesiac
Track list:
1. “Packt Like Sardines in a Crushd Tin Box” – 4:00
2. “Pyramid Song” – 4:49
3. “Pulk/Pull Revolving Doors” – 4:07
4. “You and Whose Army?” – 3:11
5. “I Might Be Wrong” – 4:54
6. “Knives Out” – 4:15
7. “Morning Bell/Amnesiac” – 3:14
8. “Dollars and Cents” – 4:52
9. “Hunting Bears” – 2:01
10. “Like Spinning Plates” – 3:57
11. “Life in a Glasshouse” – 4:34

Na década de 90 o rock perdeu força e dividiu atenção com outros estilos para a grande mídia e o efêmero se estabeleceu como parte importante da engrenagem pop.
Quantas Bandas no atual estado de efemeridade do rock conseguem compor discos atemporais e estandartes do seu tempo?
Thom & cia chegaram para esse disco rodeado pela aura mística da genialidade atemporal de Ok Computer (1997) e por ter chocado o mundo da música com o sufocante Kid A (2000).
Amnesiac é um caso clássico de disco que você ama ou
odeia profundamente, ou você se vicia e não larga mais ou raramente você volta a querer passar por essa experiência, um disco no sentido mais puro do termo. Instigante.
Sob a batuta do engenheiro de som Nigel Goldrich, uma pequena orquestra comandada pelo multi-instrumentista Jonny Greenwood e o lendário trompetista jazzy Humphrey Lyttelton, com a influência da música eletrônica experimental de
vanguarda, do jazz clássico de Charles Mingus, Miles Davis e Alice Coltrane evocando os ecos da arte conceitual contemporânea, releituras do Krautrock de bandas lendárias como Can e Faust e inspirações nos artistas da Warp (selo independente de música eletrônica), Amnesiac nos entorpece com nossos próprios sentidos ultras sonoros.
A banda assina um dos mais melancólicos e sombrios discos da sua geração e ao mesmo tempo assim como Kid A (2000) uma das mais discutidas obras que a vanguarda da música produziu nesse inicio de século XXI.

Não é um disco fácil. Amnesiac abre em estado de alerta. Baterias eletronicamente enlatada que aos poucos vão se esculpindo entre o baixo e os pequenos sussurros de guitarra e vozes indecifráveis se chocam na eletrônica em espiral de Packt Like Sardines In A Crushed Box. Yorke acusa que nossas vidas estão passando num piscar de olhos e não estamos percebendo. Como barcos navegando para os sonhos mais distantes além da vida, Yorke nos entrega um oceano surrealista em Pyramid Song. Uma balada jazz num piano descompassado onde o soluço oceânico de Yorke joga-se num “rio de olhos negros”. O arrebatador arranjo de cordas entrelaça-se com as vozes sussurrantes e trêmulas de delírios onde massas cinzentas de longínquas camadas de uivos oceânicos nos arremessam na asfixia cyborg de Pulk/Pull Revolving Doors. Portas desafiadoras pelo qual só conhecemos no mais profundo âmago da nossa consciência são adentradas por um Yorke entubado por uma voz mecânica, arte conceitual ou performance conceitual? Aqui a banda vai o mais longe até então na esquizofrenia eletrônica de vanguarda, se espatifa em camadas e camadas numa perturbadora sufocação sintética, ácida não-humana... Então nossa alma é transportada para o deserto íntimo de You And Whose Army? Um Yorke distante canta entorpecido por pesadelos futuristas. A guitarra dispersa de Jonny Greenwood logo é soterrada pelas camadas de ecos Krautrockanos, pianos, baixo e baterias ensurdecem um Yorke arrebatado e ciente de onde quer ir e numa noite gloriosa ele almeja fugir em um cavalo fantasma para dentro si mesmo.
Em I Might Be Wrong. Um timbre nervoso da guitarra de Ed’O Brien rasga o silêncio surgindo um Yorke alucinado percorrendo os túneis criados por Jonny. A guitarra repetida com simetria espacial entrecorta o ambiente urbano e perturbador, enquanto ecos fantasmagóricos o perseguem pelos corredores do seu próprio medo de fracassar em si mesmo. Ja em Knives Out uma sinfonia de guitarras e vilões dialoga dentro dos nossos cinco sentidos. A constante bateria jazz misturam nossas percepções sensoriais enquanto Yorke áspero metaforiza sobre ratos e seres humanos se confundindo no soturno alvorecer dos tempos atuais. Os labirintos dedilhados por Jonny Greenwood são destilados com uma genialidade melódica indivisível.
Chegando na metade do disco, a banda nos apresenta um nova leitura de Morning Bell. A genial bateria metronômica de Phil Selway da versão do disco anterior dá lugar a cordas e violinos e fica uma tarefa árdua saber qual a mais emblemática. Aqui Yorke
está lagrimejante e inconsolável e nessa fragilidade cotidiana de alguma manhã qualquer ele ouve oDollars And Cents. Explorando densas camadas de jazz com complexas doses de sintéticas vertigens eletrônicas, a banda toda entra cobrindo os espaços. O contrabaixo circular de Colin Greenwood e os pratos constantes da bateria de Phil metaforizam a monotonia cotidiana, enquanto teias de fanstasmagoria eletrônica vão se esculpindo se fundindo com a guitarra de Ed que vem como um trem descarrilando lentamente, enquanto Jonny cobre como um manto congelando os arredores com teclados cheio de nevoeiros.  O ambiente é esquizofrênico e alucinado e Yorke é conduzido a vertiginosa confusão de pensamentos e angustias. A guitarra se espreme pelas bordas da melodia deixando desolado o cenário cheio de rachaduras e vidraçadas. E nisso surge uma guitarra gélida explorando um canto desolador na instrumental Hunting Bers. Alguns timbres graves e um ar de devastação interior no meio de um deserto transcendente permeia para nos arremessar em Like Spinning Plates. Aranhões de vinis giram ao contrário a melodia improvável que vai conduzindo um Yorke impessoal, áspero, escalando sua própria mente como se tivesse explorando o mundo submerso dos sentidos. Ondas vagam por freqüências quase imperceptíveis, Yorke é levado pelas correntezas indomáveis do seu eu e deságua entorpecido para um último suspiro... Baseado num complexo jazz espacial de Life In a Glass House. Com letra de Jonny Greenwood e soterrado pelos trompetes de Humphrey Lyttelton um Yorke melancólico canta pelos arredores de si mesmo. Clarinetes arrastam-se pelo interior do desejo de alcançar-se, o desejo de ir até o fundo num mergulho nas próprias respostas que encontrou pelo caminho, pelo próprio infinito da sua própria infinitude. O piano alienígena de Jonny Greenwood em compassos nebulosos cria o chão para a orquestração penetrar pelos poros da melodia e fundi-la encerrando de forma improvável o disco com camadas de pequenas peças com galáxia sonoras dentro.
No disco mais esquizofrenicamente viciante do Radiohead, temos um sopro curto que às vezes parece insuportável para ouvidos não acostumados a visitar extremidades sonoras profundas. Aqui a banda se desconstrói arremessando-nos em ambientes asfixiantes de nós mesmo, onde a melodia enrosca-se pelos tentáculos das camadas da própria natureza orgânica do ser humano e entre arrebatadores arranjos de cordas e orquestrações, temos a sensação assustadora de sussurros de
oceanos, ventos metálicos vindos da nossa própria mente, horizontes que soluçam, noites longas e rios que cortam nosso interior nos perdendo nas próprias camadas de nossos delírios cotidiano e do nosso eu primordial.
Amnesiac é vanguarda é confuso, belo, áspero, frio, emocional, arrebatador, textualizado e texturizado na própria essência da arte; a de nos enriquecer com sua inesgotável plenitude e nos instigar, incomodar, nos confrontar com nós mesmo e com o mundo.
Saímos desse curto disco, desse pequeno artefato monolítico sugados, arremessados em nós mesmos ou o mais longe de nós mesmos... Isso para quem se propõe a mergulhar no tempestuoso universo existencialmente sonoro de Amnesiac.
Por: Cybernic

Kid A


(2000) Radiohead – Kid A
Track list:
1. “Everything in Its Right Place” – 4:11
2. “Kid A” – 4:44
3. “The National Anthem” – 5:51
4. “How to Disappear Completely” – 5:56
5. “Treefingers” – 3:42
6. “Optimistic” – 5:15
7. “In Limbo” – 3:31
8. “Idioteque” – 5:09
9. “Morning Bell” – 4:35
10. “Motion Picture Soundtrack” – 6:59


KID A
RADIOHEAD
EMI

O novo álbum dos Radiohead, "Kid A", remete a banda de Oxford definitivamente para fora das convenções musicais, num todo de onze faixas que promete demolir muitas almas. Uma qualquer sombra a "OK Computer" está completamente afastada.
As gravações de "Kid A" estiveram rodeadas de fortes pressões, tal o impacto causado pelo supremo "OK Computer", o álbum anterior dos Radiohead que fez render mesmo os que eram mais cépticos face à banda de Oxford. E essas expectativas e atenções elevadas, concentradas sobre os Radiohead, não eram certamente o desejo deste grupo de gente tímida, que sempre foi muito mais propícia a cultivar o anti-estrelato, alérgicos que são a excessos rock & roll género Oasis.
Orientados desde cedo pelas sonoridades indie, "Pablo Honey" foi o agradável álbum de estreia dos Radiohead, demonstrador da fogosidade rock que lhe fomos conhecendo, de uma capacidade de composição de canções de salutar, e até de alguma ingenuidade (com todas as qualidades e defeitos que esta característica humana tem). Os anos noventa ficaram a ganhar uma inconfundível voz, a de Thom Yorke, dando "Pablo Honey" o inesperado "hit" aos Radiohead, "Creep", tema denunciador de genialidade. Imperfeito e de indícios de grandiosidade futura, "Pablo Honey" é um álbum que permite à banda um vasto caminho evolutivo.
Novo passo em frente, "The Bends" é um álbum que se divide entre temas "radio friendly" de carácter mais simples (boas canções, ainda assim) - "The Bends", "High and Dry", "(Nice Dream)" - e músicas situadas num universo musical mais acima que prenuncia o "OK Computer", como o futurista arrojado "Planet Telex", e faixas intimistas e calorosas de que "My Iron Lung" e "Street Spirit" (o rasgo de génio de "The Bends") são exemplo. "The Bends" é o álbum do qual se extraem mais singles, e o que faz com que os Radiohead deixem de ser rotulados de Nirvana europeus, para passarem a ser considerados como os futuros U2 (o tempo encarregar-se-ia de provar que ambos os carimbos não poderiam estar mais errados).
De uma quase insuperável força, o terceiro álbum "OK Computer" torna-se num dos marcos incontestáveis da década de 90, que atira para as calendas gregas a proclamada morte do rock. Sucessão contínua de brilhantes canções com algum teor experimental, a inacessibilidade da música dos Radiohead aumenta à medida do seu crescente brilhantismo. Os Radiohead tornam-se na banda a ser seguida com atenção.
O ano 2000, olhado há largos anos pelos criadores da ficção científica como um período em que o indivíduo estaria já completamente desumanizado pela máquina, tem em "Kid A" um valioso documento que prova, a contrariar tal tese, o quão longe a faceta emocional inerente ao ser humano pode ir - a voz e alma de Thom Yorke. Porque é nele que quase todo o álbum se releva. O que é curioso para uma banda que é, e sempre foi, forte enquanto tal, sobretudo Ed O'Brien (elemento preponderante nas composições dos Radiohead, e um dos seus mais importantes porta-vozes) e Jon Greenwood (uma das imagens da postura melancólica e tímida da banda, foi da sua guitarra que saíram algumas das explosões sonoras características dos Radiohead, e foram dos seus teclados que se criaram alguns dos cenários idílicos na música desta banda). Mas em "Kid A", Thom Yorke é, mais que nunca, a figura central da banda.
Com a lógica excepção de "Treefingers", um instrumental minimal paradisíaco, mais propenso à criação de atmosferas de que melodias, e onde se vai constantemente ouvindo algo semelhante a um orgão de igreja, todo o álbum respira da voz de Thom Yorke, um manifesto intenso de mágoas. Sob diversas tonalidades, o seu poder vocal está melhor explorado que nunca.
Partindo do princípio de que quase todas as faixas vivem da virtude natural de Yorke, deve-se acrescentar que "Everything in Its Right Place" apresenta-se como uma magnífica desconstrução do que deve ser tradicionalmente uma música pop; "Kid A" e o mui inovador "Idioteque", apesar de deterem algumas feições electrónicas, são acima de tudo CANÇÕES; "The National Anthem" (com um som clarividente de baixo) e o ironicamente intitulado "Optimistic" (directo e simultaneamente viciador) dão-nos o lado de rock frontal dos Radiohead; "Motion Picture Soundtrack" é a faixa de características mais cinéfilas de um álbum que frequentemente sugere imagens.
Para uma banda fortemente conotada com as guitarras eléctricas (algo levado a fundo em "The Bends"), um dos dados mais atípicos deste álbum dos Radiohead reside, sem dúvida, no facto de existirem temas onde nem um acorde do citado instrumento se ouve.
Tal como PJ Harvey, os Radiohead têm comprovado de álbum para álbum uma capacidade indiscutível para superar, desde a primeira metade da década de noventa, uma fasquia que se apresenta cada vez mais elevada. Parecendo cada vez mais interessados em divorciarem-se do formato "hit" que os granjeou (à semelhança do que vai acontecendo com os Blur, em que "13" louva a estimulante que pode ser a descoberta de um álbum que nos escapa a uma primeira escuta), "Kid A" demonstra uns Radiohead bastante longe do que é supostamente a estrutura tradicional de uma canção, estando a banda britânica num nível musical extremamente evoluído.
A sua força e intensidade torna irrelevante a escolha de um qualquer tema ideal para single, para vídeo, ou para qualquer outro mecanismo promocional (percebe-se melhor após a escuta deste álbum porque é que a banda prescinde totalmente destas políticas de comercialização). Inacessível, de difícil audição, criador de saudáveis vícios, emocional, pelo menos, "Kid A" será um álbum que não deixará ninguém indiferente.
Gonçalo Palma

OK Computer


(1997) Radiohead – OK Computer
Track list:
1. “Airbag” – 4:44
2. “Paranoid Android” – 6:23
3. “Subterranean Homesick Alien” – 4:27
4. “Exit Music (For a Film)” – 4:24
5. “Let Down” – 4:59
6. “Karma Police” – 4:21
7. “Fitter Happier” – 1:57
8. “Electioneering” – 3:50
9. “Climbing Up the Walls” – 4:45
10. “No Surprises” – 3:48
11. “Lucky” – 4:19
12. “The Tourist” – 5:24

RADIOHEAD
"OK Computer"
veredicto:
| 0.0 | 1.0 | 2.0 | 3.0 | 4.0 | 5.0 | obra-prima/álbum de culto
Se tivermos de escolher apenas um álbum dos anos 90, a decisão será sempre controversa e nunca consensual. Mas se nos for permitido segurar um álbum em cada mão as dúvidas dissipam-se e termina o rol de discussões. “Nevermind” dos Nirvana marcou o último grande “hype”; “OK Computer” fez as pazes entre o rock e a electrónica; o mundo da música serenou quezílias e principiou uma nova fase; por todo o lado quem tinha perdido a fé, deambulava perdidamente ou suspirava de desconsolo pôde finalmente deitar-se, dormir e sentir-se levitar. Primeiro expiaram-se as raivas. Chegou a altura de assumirmos que o futuro está sempre a chegar e não vai parar por nossa causa. Pode ser difícil. Mas agora pelo menos temos banda-sonora para ajudar. Obrigado, Radiohead.

São 12 músicas. 53 minutos e 49 segundos. Zeros e uns queimados ou estampados na película dos CD’s. Impulsos eléctricos gravados nas fitas de crómio e ferro. Uns quantos a escutarem os arranhos da agulha no vinil. E no fundo é tudo apenas música. No fundo apenas umas quantas letras com melodia. No fundo nada. No fundo o passado não existe sem memória. No fundo o presente é apenas o futuro a acontecer permanentemente. No fundo nada disto interessa. Nada disto interessa se estivermos sós, como se ouve na voz trémula e sofrida de Yorke em “Exit Music (for a film)”: “Breathe... keep breathing / I can’t do this alone.”
E desde a Oxford de 1989 até aos nossos dias que estas “cabeça de rádio” não têm estado sozinhas. Abalando a frustração e angústia de todos os teenagers e não teenagers com o sucesso mundial que foi “Creep”, seguiu-se um álbum puramente rock; melódico, crú, suave, melífluo, áspero, seco, doce... “The Bends” estourou com várias cordas de guitarra e tops de vendas. Na TV os videoclips lá iam chamando a atenção, mas estes tipos nunca disseram que estavam satisfeitos com o que quer que fosse.
Sai o CD-single alargado “My Iron Lung” e percebe-se que há qualquer coisa mais. A banda pára. Escuta o que há à sua volta. Ouve as próprias guitarras e sente-se cansada delas. Olha uns quantos anos-luz à frente. Deixa os dias acabarem e assim que a noite se aproxima aproveita o lusco-fusco para escrever o que vai na alma; faz passar as reverberações e os arranjos por uns quantos Pentium e sintetizadores e eis que a fénix renasce novamente. “OK Computer” sai com “Paranoid Android” como single de estreia e os 6 minutos e meio transformam-se imediatamente na sinfonia para o final de milénio.
Nos dias de hoje é difícil fazer perceber a estranheza e completo espanto avassalador depois de ouvir “OK Computer” em 1997. Mais estranho só mesmo a primeira vez que “Smells Like Teen Spirit” passou na rádio no início da década. Mas os Radiohead não pretendem subverter o sistema nem tão pouco destruí-lo. Sabem que ele possui tanto de bom como de mau. Antes reflectem a angústia da solidão e o pânico da rapidez de mudanças.
Aliás, o próprio alinhamento do álbum é reflexo dessa transformação, tanto da década como na banda. Se em “Airbag” arrancamos com “In the next world war / in a jackknifed juggernaut, I am born again”, pela última faixa, “The Tourist”, já Thom Yorke implora “They ask me where the hell I'm going / At a 1000 feet per second, / Hey man, slow down, slow down”. Está tudo a mudar rapidamente demais. As linhas de metro aceleram e expandem-se. Há mais canais de TV. O MacDonald’s alargou os menús. Os desodorizantes e os telemóveis estão mais pequenos e concentrados. E não há meio de parar.
Para quem pretende encontrar o seu lugar no mundo isto é dramático. Não admira, portanto, que por entre as cartas de fãs as frases “your record changed my life” ou “...helped me” se repitam ‘over and over again’.
Fitter Happier”, faixa inteiramente lida por uma personagem informática abstracta e sem ênfase, é o documento mais emblemático do álbum, embora não o pareça. Não é completamente original, mas sumaria exemplarmente e, quase apetece dizer, ‘Orwellicamente’, o que se passa. Um tratado de bons princípios e desejos sãos, alinhamento de uma realidade idealizável e ideal. Tudo parece realmente perfeito. Parece... Não fosse a escolha da voz e a quase inaudível mensagem de fundo a passar ciclicamente: “This is the Panic Office, section nine-seventeen may have been hit. Activate the following procedure.”
Nem por acaso segue-se “Electioneering”. O álbum atinge o pico da raiva e da ironia. As palhetas gastam-se nas cordas das guitarras e percebe-se que até no mais puro rock a banda mexeu nalguma coisa. A sonoridade é apenas um dos pontos chave, mas a já referida e anterior “Paranoid Android” revela que a estrutura rompeu-se; o corpo-refrão-corpo-refrão-solo-refrão-fim ficou de fora; abriram-se as portas à completa liberdade. Para quê estar a voltar atrás sucessivamente?
Apesar da sonoridade dolorosa e das guitarras ainda prevalecerem, é inquestionável que “OK Computer” está voltado para o futuro. Cada música fala de um dilema e até de um pesadelo, de pânico e de receio, de amor e de solidão, de Yorke, dos Radiohead e de todos os felizes cidadãos a acordar de manhã e a ir para as suas aulas e locais de trabalho.
É assim que, aparentemente reconciliadora, “No Surprises” nos embala pela melodia, nos assusta com os primeiros versos mas termina com a mesma impressão geral que nos deixa ficar o álbum: de que tudo vai acontecer à mesma, só podemos mudar como e onde vamos estar a ver tudo acontecer: “You look so tired-unhappy, / bring down the government, / they don't, they don't speak for us. / I'll take a quiet life, / a handshake of carbon monoxide, / with no alarms and no surprises, / ... / Silent silence”.
Eu vou estar à varanda. Lá fora nas ruas o habitual chinfrim e zumzum de carros e gente em rodopio. Do ar uma nave extra-terrestre vai pousar por entre os aviões. O mundo vai explodir mas na certa sai no dia seguinte a notícia de que os políticos assinaram um novo tratado de cooperação. Por agora, na aparelhagem da sala o CD vai tocando. Eu digo apenas “Ok” a tudo.
Com um álbum assim até dá para aceitar o mundo e nem ficar chateado.
R.J.T.

The Bends


(1995) Radiohead – The Bends
Track list:
1. “Planet Telex” – 4:19
2. “The Bends” – 4:06
3. “High and Dry” – 4:17
4. “Fake Plastic Trees” – 4:50
5. “Bones” – 3:09
6. “(Nice Dream)” – 3:53
7. “Just” – 3:54
8. “My Iron Lung” – 4:36
9. “Bullet Proof..I Wish I Was” – 3:28
10. “Black Star” – 4:07
11. “Sulk” – 3:42
12. “Street Spirit (Fade Out)” – 4:12

abril 1995
Parlophone
THE BENDS
Esse texto foi escrito em junho de 2003 e, antes que se diga qualquer outra coisa, vale lembrar que nada melhor que o tempo para baixar a poeira e botar as revoluções em perspectiva.
The Bends foi lançado em 1995 e esses oito anos de descanso acabaram derrubando por terra muitos dos conceitos absolutos da época.
Nem o sucessor de Pablo Honey (o disco de estréia), nem a maior revolução da história musical (alguém falou Ok Computer?). The Bends acaba funcionando como um intermediário que transformaria a transição Pablo Honey-Ok Computer em uma suave rampa, ao invés do agudo degrau que poderia parecer.
Pop perfeito com dosagem exata de baladas assobiáveis, guitarras distorcidas e complexidade melódica. Em nenhum outro momento a banda (e em pouquíssimas ocasiões a música como um todo) viria a apresentar tanta perfeição como naquele disco. A exemplo do que os Beatles fizeram com Revolver, o Radiohead já bradava ali aos quatro ventos que não era estanque, que recusava a acomodação.
Como não sorrir à mera menção de uma melodia perfeita como a de "Street Spirit"? Como não grudar na cadeira com os espasmos distorcidos de The Bends?
Da fofura de "[nice dream]" e "Bulletproof" à furia de "Just", não há falhas aparentes no álbum.
Falha é não tê-lo.
18 Ovos.
Incluindo os meus.
18 ovos (a nota máxima é 5)
Matheus "Daigoro" Pacheco
9/6/2003, Omolete

Pablo Honey


(1993) Radiohead – Pablo Honey (Japanese Version)
Track list:
1. “You” – 3:29
2. “Creep” – 3:56
3. “How Do You?” – 2:12
4. “Stop Whispering” – 5:26
5. “Thinking About You” – 2:41
6. “Anyone Can Play Guitar” – 3:38
7. “Ripcord” – 3:10
8. “Vegetable” – 3:13
9. “Prove Yourself” – 2:25
10. “I Can’t” – 4:13
11. “Lurgee” – 3:08
12. “Blow Out” – 4:40
13. “Pop Is Dead” [Japan bonus track] – 2:12
14. “Inside My Head” [Japan bonus track] – 3:11
15. “Million Dollar Question” [Japan bonus track] – 3:17
16. “Creep” (live) [Japan bonus track] – 4:05
17. “Ripcord” (live) [Japan bonus track] – 3:13

PABLO HONEY



Exatos dez anos são a diferença entre Pablo Honey, o primeiro álbum do Radiohead, e Hail to the Thief. A maneira mais imparcial de se analisar o disco de estréia é esquecer de que se trata de Radiohead.
Explico: é inegável que o Radiohead de hoje é muito superior a Pablo Honey, afinal, volto a dizer, passaram-se dez anos e estamos falando de uma banda que inova e se supera a cada trabalho. Contudo, é igualmente inegável que inúmeras bandinhas da atualidade dariam tudo para fazer um álbum como aquele.


O que pode parecer ultrapassado - levando-se em conta o que o Radiohead significa HOJE, é bom frisar - na época em que foi lançado já dava mostras do que viria a ser aquela promissora combinação de talentos de Oxford.
A força de Pablo Honey e principal responsável pelo Radiohead ter se destacado numa época em que ótimas bandas brotavam dos mais inóspitos lugares do mundo - estamos em pleno grunge de Seattle e no ressurgimento do britpop - reside nas letras. O Radiohead é freqüentemente rotulado de depressivo, quando, justiça ainda que tardia seja feita, o que faz é mesclar suas letras com lirismo e ironia em dosagens equivalentes.
Esse "algo mais", a fórmula de encaixar palavras que Thom Yorke guarda a sete chaves, já era onipresente em Pablo Honey. Só por isso o álbum já vale muito a pena. A "ausência" que algumas pessoas podem sentir vem das experimentações que a banda faria em seus trabalhos futuros. Pablo Honey soa cru, ingênuo até, mas estão ali algumas evidências do fenômeno Radiohead, que começava a ser semeado.

Muito se enganam os reducionistas que se referem a Pablo Honey como "aquele disco do Radiohead que tem ‘Creep’" como se essa música fosse a única coisa interessante a ser ouvida.
Vale lembrar que, por conta disso, reza a lenda que Thom Yorke ficou apavorado com as proporções do sucesso alcançadas por "Creep", já que ela não foi um estrondo restrito ao Reino Unido. Engolida pela movimentação que acontecia na época nos Estados Unidos, a canção foi erroneamente eleita o hino britânico do grunge. Assim, pairavam no ar as suspeitas de que o Radiohead seria apenas mais uma banda de uma música só, ou seja, que tudo o que tinham para mostrar reduzia-se à "Creep".

O tempo provou exatamente o contrário, mas se esse ainda for o seu caso, caro internauta, ainda dá tempo de se redimir. Pablo Honey tem outras preciosidades que merecem uma audição atenta.
"You" - as guitarras estão lá, a concisão e a harmonia também.
"Stop Whispering" - poderia ter sido facilmente outro grande sucesso na seqüência de "Creep": refrão grudento, Thom Yorke em vocais inspirados, letra idem.

"Anyone can play guitar" - note a ironia típica do Radiohead pondo as manguinhas de fora. Distorções bem-vindas.
"Vegetable" - emocionada, densa, mais um indicativo dos caminhos que o Radiohead viria percorrer.
"I can´t" - saca só o encaixe das palavras que falei ali em cima:
Please forget the words that I just blurted out
It wasn't me it was a strange and creeping doubt
It keeps rattling my cage
There's nothing in this world will keep it down

Totalmente poderosa.
Tem também "Prove Yourself", "Blow out", "How do you?", "Thinking about you"...

Pablo Honey é item indispensável em qualquer boa discoteca. Se não pela qualidade (que o próprio Radiohead acabou superando nos álbuns seguintes), pelo "simples" fato de ter iniciado a carreira de uma das bandas que mais tratam a arte como matéria-prima.
5/5
Luciana Maria Sanches
9/6/2003, Omolete

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