Entrevista a Thom Yorke
E se os Radiohead desaparecessem? E se Hail To The Thief fosse o último álbum do grupo? A hipótese é adiantada pelo próprio Thom Yorke, longe das câmaras. Mas por agora descansem, o disco está aí, num elegante compromisso entre OK Computer e Kid A, o mundo visto por Thom Yorke.
P.: O seu último álbum reflecte a sua recente condição de pai?
R.: Sim, de muitas maneiras. Reflecte a minha nova preocupação relativamente ao futuro, ao que foi feito em nosso nome e a tudo aquilo que o afecta, na sua totalidade, e em cada uma das suas formas. Mas também reflecte a redescoberta das razões que me levaram de volta à música. De certa forma, o meu filho faz-me pensar, faz-me lembrar por que sou músico.
Estava a tentar não entrar nesse tipo de sentimento, porque sou muito propenso a esse tipo de fantasias paranóicas sobre o nosso futuro. É assim que eu sou. Não queria envolver isso na música. Eu estava a escrever e, por estar a trabalhar muito depressa, foi este o material que apareceu primeiro. Como estava a trabalhar muito depressa, não tive tempo de o reescrever. Estava a fazer um esforço para tirar as coisas do contexto, para ir fazendo pouco a pouco e tentar não associar as coisas. E o mais engraçado é que as canções foram escritas há 4 anos...
Uma sonoridade sempre actual e que tem em "There There" o seu cartão de visita...
Houve uma canção que me ficou na cabeça durante muito tempo... O mais engraçado é que nunca me cansei de nenhuma das melodias. Nunca me cansei delas. Não há muitas canções assim para mim... [sorriso]
Um tema de eleição que os mais atentos podem pensar que já tinham ouvido... E talvez seja verdade, os 14 temas de Hail To The Thief foram experimentados ao vivo em Portugal. Quanto ao registo em estúdio, aconteceu em Los Angeles, California, a cidade que serviu de inspiração ao embrulho do disco.
Quando estávamos em Hollywood a gravar o disco - parece muito glamoroso, não é? É fantástico. [sorriso] - ... eu e o Stanley [Donwood] normalmente fazemos estas coisas juntos, mas como estávamos a trabalhar tão depressa, ele fê-lo [o artwork] desta vez sozinho. Quando não estávamos a trabalhar andávamos de carro por Bel Air e Beverly Hills, ouvíamos a música hip hop "Qasi Modo" em altos berros com os vidros do Range Rover abertos, a tentar parecer o mais ameaçadores possível. Como eles têm alertas de segurança por todo o lado - todas casas têm avisos como "Mantenha-se afastado" - nós conduzíamos por ali e ele escrevia o que estava escrito nos sinais.
Os sentidos por vezes proibidos, por vezes únicos, sentidos que traçam o rumo das ideias de Thom Yorke, um homem perturbado com a ideia de um mundo em guerra, a guerra que lhe tira o sono, guerra que o faz olhar o planeta de forma aterrorizada...
Para ser sincero, o meu maior medo em todo o mundo são as pessoas que consideram que já não têm voz, que consideram que não têm controlo sobre o nosso futuro ou o nosso destino, como planeta, e que o Mundo inteiro desista simplesmente.
Cada dia é como uma mulher com medo de ratos, que salta para cima de uma cadeira, puxa as saias e os ratos andam todos ali à volta. Os Governos continuam a "puxar as saias cada vez mais" para fugir dos "ratos", porque têm medo dos ratos, querem fugir. Eles já não querem saber, estão muito assustados. O meu governo está muito aterrado com o que as pessoas pensam, mas, no fundo, ninguém vai preocupar-se e fazer alguma coisa.
Agora que é pai, Thom Yorke revela muito de miúdo. Por dentro, fez um regresso às origens. Por fora, sente-se nas músicas e nas palavras de um homem que poucas vezes fala, mas que quando fala diz o que sente.
Quando era miúdo fiz várias operações ao meu olho e andei em hospitais. Quando me punham a máscara, muitas vezes ouvia a rádio e sentia o cheiro... quando pomos a máscara, começamos a... [Thom deita a cabeça para trás e gesticula como um esquizofrénico, e ri-se]
jornalista: Rui Pedro Reis
"Música do Mundo", Sic Notícias 2003
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